Camille Claudel

Uma Mulher

2010-01-01

A ruptura do equilíbrio na obra de Camille Claudel

Em algumas das obras de Camille Claudel, nota-se um claro desafio às leis do equilíbrio. Umas mesmo no limite do possível (“A Valsa”, “A Fortuna”) e outras já no domínio do fisicamente impossível (“A Implorante”). Este jogo do equilíbrio instável, significa uma nítida vontade em representar as verdadeiras forças do movimento, tanto do meu agrado, como também pode significar um forte sentimento de falta de identidade, que deriva de várias situações insuportáveis e traumáticas, que a atormentaram desde criança.

Em primeiro lugar com a sua mãe, ao considerá-la um objecto de compensação pela perda do seu primeiro filho. Camille foi concebida durante o período de luto da mãe e não será, aliás, por acaso, a atribuição do nome de Camille, que, em francês, tanto se dá a raparigas como a rapazes. A situação traumática que a mãe viveu, que tanto queria ter tido um filho, pode explicar essa decisão. Mais difícil de compreender, porém, será o sentimento de autêntico ódio com que sempre terá tratado Camille.

Parece, no entanto, que essa atitude não seria só dirigida contra Camille, pois Paul Claudel escreveria mais tarde: “A nossa mãe era o contrário duma mulher do mundo, ocupando-se de confeccionar as roupas, cozinhar, jardinar, tratar dos coelhos e das galinhas, sem um momento para pensar nela ou nos outros da família. Doçura, delicadeza e suavidade, eram maneiras que não se usavam em nossa casa. A nossa mãe nunca nos abraçou.”

Os sucessivos traumatismos e desequilíbrios que Camille sofreu em criança, provocados pelo desprezo da mãe e pela permanente ausência do pai, foram-lhe nefastos para a procura de uma identidade, dando-lhe todas as justificações para, no silêncio da sua mente, viver o drama insuportável de insegurança no convívio, que a levou a ter comportamentos reactivos de violência e a detestar as reuniões “mundanas” a que ia, primeiro na companhia de Paul e, mais tarde, na companhia de Rodin.

A representação da ruptura do equilíbrio é, ao mesmo tempo, fascinante e preocupante, pois pode indiciar um estado de algum desequilíbrio mental, que a leva, já no final da sua carreira, que não da sua vida, a atribuir-se a si própria a representação da Medusa, transformada por Afrodite num monstro de serpentes no cabelo, temido e desprezado pelos homens e pelos deuses.

O forte registo de desequilíbrios que se vê nalgumas das suas criações, pode ser, talvez, reflexo de um sofrimento interior de tal modo dominador, que acabamos por não saber se não terá sido esse mesmo sofrimento que a conduziu à realização da obra. Como se a escultura, para ela, representasse uma tentativa de se agarrar a qualquer coisa, que a aliviasse da psicose que a atormentava. Aliás, “La Niobide blessée”, “Clotho” e “L’âge mûr”, por exemplo, são bem representativas da sua história de vida, bastante descompensada.

A segurança básica que falta a Camille na infância, pode justificar a dolorosa ameaça ao seu equilíbrio, que se traduz no desequilíbrio espacial dos seus personagens. Na sua ânsia de fixar o fugaz, procurou o frágil equilíbrio, sentimento que a dominou desde criança.


(por Ruben Marks)