Camille Claudel

Uma Mulher

2010-01-01

A tocadora de flauta
(La Sirène ou La Joueuse de flûte) (1900-1905)

Uma das últimas esculturas de Camille Claudel, que parece ter sido a sua predilecta, foi “A tocadora de flauta”. Trata-se, uma vez mais, da expressão real do movimento da vida, do movimento de um corpo enlevado e embalado pela música interior da artista, num momento em que ela se ressuscita a si mesma. É, sem dúvida, uma magnífica obra de arte, que reflecte o estilo de Camille na sua máxima plenitude, quando, em termos técnicos, já tinha alcançado a harmonia da perfeição.

Apesar do descontrolo mental que a começava a consumir, após a separação definitiva de Rodin, com a morte a cercá-la lentamente, numa solidão desesperante a que se entregou, Camille ainda tem forças para talhar, nesta pequena escultura, um magnífico e entusiasmado hino glorificando a vida. Com ela, quis como que imortalizar a sua amarga vida, com um belo canto de apaixonado sentimento.

“A tocadora de flauta” evoca o desejo do triunfo, de alguém que está amarrado a um destino e que se liberta das trevas para seduzir e encantar. A música é, seguramente, enfeitiçadora, funcionando como uma atracção inspiradora. Estamos perante um artifício da sedução de um corpo de mulher jovem, na frescura da vida, como que a querer afastar o fim trágico que esperava Camille.

A forma volumétrica da composição, traduz uma relação com o espaço, cuidadosamente marcada pelos limites arredondados do corpo, numa esfumada mistura com o instrumento.

A obra foi exposta pela primeira vez no Salão dos Artistas franceses em 1905 e, no mesmo ano, na Galeria de Eugène Blot, seu amigo. A crítica da época foi entusiástica e unânime em considerar que Camille havia atingido o auge da sua arte: “Vê-se uma sereia, sentada com os joelhos apertados e todo o corpo elevado aos lábios, onde a flauta divina derrama, com o seu agudo fluxo, paixões extra-humanas. Com a garganta insuflada pelo agitar de asas de pombas, do vento das florestas e do furor dos mares, provoca a Musa a dizer-lhe: Tu não és a que canta, tu és o próprio canto no preciso momento em que a escultura é concebida”, escreve o crítico de arte do jornal ".

Esta obra, "A tocadora de flauta" ou "A Sereia" (“La Sirène”, como também lhe chamou), está sobretudo próxima de peças antigas, como "La jeune fille à la gerbe" ou de "A Valsa", com aquelas asas esvoaçantes características da Arte Nova. Esta ambiguidade dificulta a datação e mostra que, depois de 1897, Camille utiliza com frequência modelos de obras antigas, sem dúvida para ultrapassar a crise de inspiração em que se encontrava.

(por Ruben Marks)